Embora os plásticos sejam essenciais para o nosso dia a dia, eles são materiais duráveis que não se degradam facilmente, levando décadas ou até séculos para se decompor em aterros sanitários e na natureza.
De acordo com o site Phys, mais de 82 milhões de toneladas métricas de tereftalato de polietileno (o conhecido plástico PET) são produzidos globalmente a cada ano para fazer garrafas de bebida, embalagens, roupas e tapetes, e é uma das maiores fontes de resíduos plásticos.
Pensando nisso, cientistas do Laboratório Nacional de Energia Renovável (NREL) do Departamento de Energia dos EUA (DOE) estão trabalhando em uma possível solução para resíduos de PET, combinando química e biologia para transformar o plástico em um material de náilon com melhores propriedades, que pode ser usado para criar uma gama mais versátil de novos produtos.
Em parceria com o Bio-Optimized Technologies to keep Thermoplastics out of Landfills and the Environment (BOTTLE, sigla em inglês para Consórcio de Tecnologias Bio-otimizadas para manter os Termoplásticos Fora de Aterros Sanitários e do Meio Ambiente) pesquisadores do NREL e do Oak Ridge National Laboratory (ORNL) projetaram uma bactéria para converter PET desconstruído em blocos de construção para um produto de náilon superior.
Conforme descrito no artigo científico publicado na Metabolic Engineering, esses monômeros de alto desempenho podem ser reciclados em materiais e produtos plásticos de alto valor, um processo conhecido como upcycling.
Economia circular na administração dos resíduos plásticos
“Essa etapa de conversão biológica é uma parte importante da equação que torna possível o reaproveitamento de PET, criando a oportunidade de transformar garrafas plásticas poluentes em materiais de fabricação valiosos, levando-nos, em última instância, para mais perto de uma economia circular em escala”, disse o cientista do NREL e primeiro autor do estudo, Allison Werner.
A economia circular pode estender a vida útil das moléculas para fazer plásticos virgens, enquanto reduz o desperdício, conserva recursos e aumenta a eficiência. Isso pode ajudar a entregar suprimentos fabricados com menos matéria-prima e energia e ficar longe dos aterros.
“Os grandes vilões dessa história não são os plásticos, mas sim nós, humanos, que os descartamos de forma incorreta. Os plásticos trouxeram grandes avanços para a sociedade, e, na minha opinião, não conseguimos mais viver sem eles”, diz Emiliane Daher Pereira, doutora em ciência e tecnologia de polímeros pelo Instituto de Macromoléculas Professora Eloisa Mano (IMA), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Em entrevista ao site Olhar Digital, ela afirmou que “a solução para tudo isso é a economia circular, que é baseada no reuso e na reciclagem”.
“Quanto mais reciclamos, mais estamos mantendo o meio ambiente sustentável para as gerações futuras pois diminuímos as emissões de gases de efeito estufa que provocam a mudança climática global, já que a maior parte dos plásticos que usamos hoje em dia são de origem de petróleo. Além de evitar a poluição dos centros urbanos e dos oceanos, a reciclagem também agrega valor a algo que era considerado lixo, favorecendo uma atividade rentável, gerando novos empregos, e reduz a quantidade de resíduos enviados para aterros sanitários ou depósitos de lixo, prolongando a vida útil desses locais”.
Os pesquisadores do BOTTLE estão explorando como uma série de processos químicos e biológicos podem ser usados para desconstruir resíduos plásticos e transformá-los em materiais recicláveis de maior valor.
Ao empregar um processo químico catalítico, os cientistas projetaram a bactéria Pseudomonas putida KT2440 para converter o PET no ácido β-cetoadípico químico (βKA), um bloco de construção para náilon com desempenho avançado.
Cada tipo de plástico tem propriedades específicas
Pesquisadores do NREL e do ORNL atuaram de forma colaborativa na engenharia das bactérias. O ORNL projetou a bactéria para utilizar um intermediário chave na decomposição do PET, o que permitiu à equipe do NREL construir uma plataforma completa para bioconversão.
Cada tipo de plástico tem suas propriedades moleculares específicas, que, potencialmente, requerem diferentes métodos de desconstrução. O PET pode ser desconstruído em monômeros usando vários processos químicos diferentes.
No entanto, os métodos mecânicos usados na maioria da reciclagem de PET hoje podem resultar em produtos de baixa qualidade e menos lucrativos, levando a baixas taxas de aproveitamento. Várias fontes mostram que, atualmente, apenas de 15% a 35% de todas as garrafas PET encontram uma segunda vida.
As transformações biológicas projetadas nesse estudo com a P. putida, emparelhadas com um processo químico catalítico de glicólise, podem criar um produto mais valioso a partir do PET e, em última análise, incentivar taxas de recuperação mais altas – eventualmente se traduzindo em menos garrafas de plástico descartadas poluindo as águas oceânicas e as montanhas áreas selvagens.
O material extraído por meio dessa desconstrução catalítica e da técnica de conversão biológica oferece melhores propriedades do que os tipos comuns de náilon que pretende substituir, incluindo menor permeabilidade à água, maior temperatura de fusão e maior temperatura de transição vítrea.
Essas vantagens de desempenho expandem as maneiras como o material pode ser usado, inclusive para peças automotivas que precisam resistir a altas temperaturas. O aumento do valor do material reciclado pode incentivar a indústria a reciclar mais, levando à recuperação do plástico em uma escala muito maior.
Embora essa descoberta inicial já prometa expandir as oportunidades para o upcycling de PET, os pesquisadores continuam a refinar a abordagem. Além de otimizar a interface química-biologia, a equipe está avaliando outros fatores.
Os fluxos de resíduos de PET pós-consumo podem conter aditivos que a bactéria pode ser incapaz de catabolizar. A caracterização desses fluxos para identificar os produtos químicos presentes e as vias metabólicas de engenharia para permitir o consumo desses compostos também serão necessários para maximizar a eficiência do processo de bioconversão, aumentar os rendimentos e lidar de forma abrangente com os resíduos plásticos.
Segundo a equipe do NREL, serão feitas uma análise técnico-econômica e uma avaliação do ciclo de vida para construir uma melhor compreensão dos requisitos de energia do processo e das emissões de gases de efeito estufa.
“Os plásticos revolucionaram a vida moderna, mas, até recentemente, a fabricação de plásticos seguia uma economia estritamente linear e fazia uso intensivo de carbono”, disse o pesquisador sênior do NREL e autor sênior do artigo Gregg Beckham.
“Abordagens circulares para esse problema podem reduzir nossa dependência de carbono baseado em fósseis e, assim, reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Com a produção anual de plástico estimada em quase 600 milhões de toneladas até 2050, a hora de agir é agora”, afirma Beckham. (Fonte: Olhar Digital)