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Saiba como são feitas as garrafas de vidro e por que estão em falta no mercado

A indústria de vidro não passou ilesa aos efeitos da pandemia do coronavírus. A produção, porém, não sofreu exatamente com falta de matéria-prima, mas sim, com o aumento da demanda por conta da mudança de hábitos da população.

Conforme o público reduziu o hábito de beber fora de casa, por exemplo, caiu a demanda por garrafas retornáveis e subiu a pressão sobre as long necks, que são descartáveis. O mesmo aconteceu com a alta da venda de vinhos durante a pandemia.

E quando o g1 apontou que a falta de garrafas havia criado problemas de distribuição de bebidas para bares e restaurantes, boa parte dos comentários de redes sociais indicavam a solução óbvia para o problema: incentivar a reciclagem.

Mas não seria o suficiente. A reportagem voltou às fontes para perguntar se um processo de reprocessamento robusto poderia resolver ou atenuar a crise de oferta, e visitou a maior fábrica de vidro do Brasil, com produção de 3 milhões de garrafas por dia, para entender o processo de produção e de reciclagem — que estão descritos mais adiante.

Os produtores reiteraram, contudo, que o cerne da questão é a capacidade produtiva da indústria brasileira de vidro. O setor trabalha no limite, ao contrário do que acontece com outros segmentos da indústria que sofrem com logística e falta de insumos.

Para produzir mais garrafas de vidro — tanto em número, como em variedade de cores e formatos — seriam necessárias fábricas maiores, mais maquinário, mais moldes etc.

“Viemos de um período de crise, entre 2015 e 2016, e a indústria não investiu na velocidade que o mercado cresceu. Houve um descompasso. O gargalo é que todas as fábricas de vidro estão trabalhando no limite”, diz Hugo Ladeira, presidente da Owens-Illinois.

As novas fábricas brasileiras devem ficar prontas apenas em meados de 2023, como mostrou a reportagem do g1 em dezembro. Enquanto isso, Ladeira diz que a solução tem sido a importação, mas o vidro é um produto caro de transportar porque garrafas ocupam espaço vazio, piorando a relação custo-benefício.

Como é produzido o vidro?

O vidro é feito a partir de uma junção de areia, barrilha (carbonato de sódio), calcário, feldspato (alguns tipos de minerais) e outros produtos químicos que são misturados dentro de fornos. A mistura é aquecida a cerca de 1.500 ºC para chegar no ponto necessário. Essa fusão já define, por exemplo, a cor do recipiente de vidro a ser produzido.

A substância incandescente entra em moldes que definem o formato final do produto, seja uma garrafa ou pote. Não há também diferença de composição entre as retornáveis e as descartáveis (chamadas pela indústria de “one way”). O que muda é a grossura do vidro usado e estrutura da garrafa, que se define nos moldes.

Para fabricar vidro reciclado, a mistura ganha a adição de cacos de vidro antigo sem contaminação. Isso gera uma redução do uso da matéria-prima virgem e do consumo de energia elétrica e combustíveis para a fusão do novo vidro.

A reciclagem fica, então, limitada ao propósito sustentável. Segundo a Owens-Illinois, cada 1 tonelada de vidro reciclado gera economia de 3% no consumo de energia do processo produtivo e com 1 tonelada de cacos, é possível reduzir a emissão de meia tonelada de CO2.

“O vidro tem uma capacidade de ser reciclado infinitamente. E ainda se produz uma nova garrafa com ganho de custo porque se usa menos energia do que faria com matéria-prima virgem. Temos total interesse de que todo o material que vai pro consumo retorne para nós”, diz Ladeira, da Owens-Illinois.

Mesmo as empresas de bebidas já têm iniciativas de reciclagem de vidro para otimizar a produção de garrafas.

A Ambev tem uma divisão no Rio de Janeiro que fabrica garrafas. Por lá, mais de 50% da matéria-prima utilizada são de cacos oriundos de parcerias com empresas de logística reversa e cooperativas. E, recentemente, a empresa lançou long necks retornáveis da marca Corona.

“A operação acontecerá de forma faseada e começa em junho na cidade de Curitiba (PR), onde Corona vai substituir 100% das garrafas pelas retornáveis e colocar em prática com consumidores reais a rotina de devolução das embalagens, preservando a conveniência com pontos de recolha distribuídos pela cidade e apoio logístico pelo aplicativo de bebidas Zé Delivery”, diz nota da empresa.

A Heineken afirmou que apoia iniciativas de reciclagem e desenvolve um programa, iniciado em São Paulo, em que estimula a reciclagem de vidro com máquinas de coleta que trituram o material para auxiliar a circularidade completa do vidro.

Segundo a empresa, o projeto é feito em parceria com o Hub Incríveis, a startup 4R Glass e, a partir de uma nova etapa piloto, em Minas Gerais, a Owens-Illinois também passou a fazer parte da ação.

Como pressionar por mais reciclagem?

O Panorama do Saneamento Básico no Brasil, monitoramento comandado pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, mostra que o vidro representa 5% de toda a composição do lixo sólido do mundo. Está atrás de papel e papelão (17%) e do plástico (12%).

Mas a coleta seletiva ainda é privilégio de áreas mais desenvolvidas e majoritariamente urbanas. O levantamento constatou que a medida está presente para 33,9% da população urbana do Brasil.

E há ainda a questão das perdas. Dentro de toda a coleta de recicláveis, a recuperação de materiais estimada para o ano de 2020 foi de 1,07 milhão de toneladas, o que equivale a 5,4% da massa de recicláveis secos potencialmente existente (de quase 20 milhões de toneladas).

“Se fosse possível dar uma nota de zero a 10, a reciclagem de vidro ganharia uma nota 2”, diz Carlos Silva Filho, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe).

Segundo a associação, o Plano Nacional de Resíduos Sólidos estabelece a metas quantitativas que devem ser alcançadas até 2040, com marcos temporais a cada 4 anos, iniciando em 2024. Assim, os municípios precisam elaborar seus planos de descarte de resíduos, incluindo a coleta seletiva.

“A atitude individual mais efetiva do cidadão é participar da construção do Plano de Resíduos na sua cidade, encaminhar contribuições e comentários. É o único caminho para mudar positivamente o cenário”, diz Silva Filho.

Em casa, os resíduos secos para reciclagem precisam de uma limpeza superficial antes de serem jogados fora. Segundo o Panorama do Saneamento Básico no Brasil, basta deixar as embalagens de molho ou na pia enquanto lava outras louças. “Limpo e organizado o resíduo seco não será confundido com resíduo úmido, não ocasionará problemas durante o armazenamento e seguirá para a valorização pelo tratamento mais adequado”, afirma o documento. (Fonte: g1 – Por Rafael Martins)

Clique aqui para conferir detalhes da visita do repórter Rafael Martins à fábrica da Owens-Illinois.

 

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